terça-feira, 3 de junho de 2014

TORTUOSO CAMINHO DA JUSTIÇA FISCAL



















Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 03/06/2014 - A172

A recém-empossada diretora financeira contratou de imediato um profissional contábil capaz de promover uma eficiência sem precedente na empresa; algo que desse um freio na roubalheira dos outros sócios. O contratado, de fato, era um brilhante especialista em controle interno, que depois de vários meses de preparação, enfim, concretizou o sonho da sua diretora. A coisa toda era um primor de gestão contábil financeira: tudo on-line, tudo amarrado, tudo evidenciado, todos os processos conectados. Ou seja, tudo perfeito demais na opinião da chefona. O problema é que ninguém da diretoria pode mais roubar; nem os sócios larápios, nem também a diretora financeira, que nunca imaginou algo tão enrijecido, nem também poderia supor que o contratado fosse um homem incorruptível. Por isso, não adiantava envolvê-lo com mensagens subliminares ou com jogos de sedução propinolísticas. O jeito então foi aturar o contador caxias e adotar uma conduta administrativa ética e responsável.

A complexa estrutura da secretaria de fazenda cumpre diariamente a sua função de fazer valer a legislação fisco tributária. Cada departamento abriga um grupo de funcionários capacitados para executar suas atividades técnicas como também para atender as demandas dos contribuintes. Tudo rigorosamente pautado por diversos códigos legais. Ou seja, isso pode, aquilo não pode; isso é assim, aquilo é assado etc. Todo esse formalismo acontece numa faixa, numa banda, num nível específico e direcionado à massa volumosa de contribuintes, o povão. Depois do expediente os gabinetes dos mais ilustres funcionários se transformam em pontos de acolhimento de algumas demandas específicas a merecer atenção especial. Nesses momentos mais íntimos os rigores deixam de ser tão rigorosos e os assuntos tratados se transformam em objetos maleáveis ao ponto de se ajustar aos interesses dos presentes à mesa de reunião. Os problemas surgem quando um ou vários outros funcionários do órgão passam a discordar e até a combater determinadas ações antiéticas dos colegas afeitos a práticas censuráveis. Da mesma forma, os conflitos se tornam frequentes quando normas fiscais abusivas propostas por uma gerência é combatida por chefes de outras gerências, que teimam em apelar para o senso de justiça fiscal. Ou seja, por sorte nem todo mundo é farinha do mesmo saco.

Com o intuito de conferir eficiência ao processo de controle fisco tributário o governo criou o monstrengo denominado SPED. Com isso, a movimentação fiscal das empresas está dentro dos computadores dos fiscos federal e estadual: todas as notas de compra, de venda; ajustes, apurações; para alguns a movimentação contábil etc. Ou seja, agora ficou difícil para o auditor fiscal estabelecer uma relação fisiológica com o contribuinte de modo a construir uma historinha bonitinha a quatro mãos. No tempo do papel a história válida era aquela escrita com a tinta dos acordos lesivos ao erário. Agora, o processo foi alçado a um sofisticado patamar tecnológico, exigindo muito preparo daquele que se aventurar em manobras fiscais arriscadas. Ou seja, como fazer sumir um pacote de notas fiscais do sistema se a Receita Federal tem uma cópia de tudo? Como reconstruir uma EFD já transmitida, considerando seus vínculos com diversas outras operações? O desenvolvimento de eficientes mecanismos de inteligência artificial está conferindo ao governo um poder controlador nunca antes imaginado, que no momento ainda não alcançou voo de cruzeiro devido a fatores humanos. Quando o processo de controle total se consolidar, até o chefe maior ficará impedido de ajudar todos os amigos necessitados.

Para incomodar mais ainda a vida dos sonegadores e corruptos de plantão, a SEFAZ AM criou nesse ano o seu núcleo de Inteligência Fiscal. Ou seja, o órgão está se preparando para gerenciar eficazmente a massa de metadados armazenada no repositório do SPED. Além disso, também está se capacitando para investigar práticas complexas de sonegação tributária, além de outros delitos. Mas, como dito antes, o fator humano é o agente crítico do projeto.

O Protocolo ICMS N° 66/2009 dispõe sobre a instituição do Sistema de Inteligência Fiscal (SIF) e intercâmbio de informações entre as unidades da Federação, tecnicamente denominadas Unidades de Inteligência Fiscal dos Estados (UnIF). O projeto é baseado na mútua cooperação técnica e intercâmbio de informações no interesse das atividades de inteligência fiscal, tudo pautado numa doutrina orquestrada pela Receita Federal do Brasil. O texto da lei parece um manual de detetive, o qual trabalha conceitos metafísicos de interpretação e avaliação de situações complexas, envolvendo elementos psicológicos e cognitivos. Isso, sem falar na utilização dos mais avançados recursos de tecnologia da informação. Resumindo, parece que o Fisco está na vanguarda tecnológica quando o assunto é inteligência fiscal. Na retaguarda estão as organizações que ano após ano permaneceram inertes enquanto o Fisco construía sua teia.

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