terça-feira, 3 de dezembro de 2013

15 MILHÕES DE COMBINAÇÕES TRIBUTÁRIAS



















Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 03/12/2013 - A148

Segundo o grande tributarista Raul Haidar, a administração fiscal do nosso país em todos os níveis já está a merecer estudos especializados da psiquiatria. O motivo dessa afirmação é o fato da nossa ensandecida estrutura legislativa revelar comportamentos anormais dos seus autores, os quais são incapazes de raciocinar e agir com um mínimo de lucidez. E a coisa vem se agravando num ritmo acelerado e preocupante, como um tsunami a comprometer os pilares da nossa ordem social. A emblemática lambança da Instrução Normativa RFB 1397 extrapolou todos os limites do bom senso, visto que mandaria meio mundo de empresas a reabrir seus últimos balanços para identificar excessos de distribuição de dividendos. Por sorte, o estrambótico dispositivo caiu e se espatifou no chão. Na realidade, foi derrubado pela ação conjunta de diversas entidades representativas do poder econômico, o que fez o governo cair em lamentos profundos. Também pudera!! Conforme afirmação do sr. Claudio Yano, auditor da Ernst & Young, a  base tributável estimada era de um trilhão de reais.

De acordo com uma recente publicação da Folha de São Paulo, o Brasil possui 15 milhões de combinações tributárias, entre obrigações federais, estaduais e municipais. Tal informação é produto de um estudo elaborado pelo sindicato das empresas de serviços contábeis de São Paulo (Sescon/SP), onde nem as empresas do Simples escapam do cipoal emaranhado de regras destoantes. A implacável tempestade burocrática que dificulta por demais a navegação dos transatlânticos corporativos é a mesma que o microempresário tem que enfrentar com sua canoa. Tantas e tamanhas convulsões do nosso instável ambiente legal fazem com que os donos dos pequenos negócios fiquem absolutamente atordoados e inseguros. O pior é que as entidades que deveriam protegê-los são capachos do mesmo governo que ataca o bolso do pequeno empreendedor como um cão raivoso.  Para piorar um pouquinho, os entes tributantes vivem a trocar os pés pelas mãos com suas legislações talhadas no machado cego, as quais se transformam em objeto de contestação a entupir o já sobrecarregado poder judiciário.

Em meio a tantas adversidades enfrentadas pelas pequenas empresas, finalmente surgiu um evento alentador. O Projeto de Lei Complementar 237/2012, que está em discussão no Congresso Nacional, propõe o fim da substituição tributária para as micro e pequenas empresas e ainda traz outras categorias econômicas para o guarda-chuva do Simples Nacional. Esse projeto, claro, como era de se esperar, está sendo ferozmente combatido pela Receita Federal e pelos governos estaduais, que querem continuar rechaçando a iniciativa daqueles que se sacrificam para gerar empregos e movimentar a economia do país.

O mais curioso nas ações do fisco é que seus representantes (funcionários de todos os níveis) são convictos de que o sistema está errado, de tal forma que não cumpririam à risca tudo que está escrito na legislação tributária se por acaso fossem empresários. Dificilmente, um auditor fiscal obrigaria, por exemplo, o filho empreendedor a cumprir rigorosamente as ditas 15 milhões de combinações tributárias. Dessa forma, se ninguém acredita na legitimidade do sistema, porque então ele subsiste? Esse raciocínio nos leva a conclusão da existência de uma tirania fiscal, onde a vontade do imperador desce como lava vulcânica a incinerar tudo ao seu redor. Por isso, deve ser muito constrangedor para um fiscal se vê obrigado a destruir uma empresa e seus empregados com multas e autuações, mesmo sabendo que seria impossível para o autuado arcar com o tal Custo Brasil. Seria preciso ter espírito de porco para tratar tudo com naturalidade, face o estado de perversões legais instalado no país. Não à toa, somos diariamente bombardeados com notícias de crimes envolvendo funcionários públicos das áreas de fiscalização.

Tantas convulsões, tiranias e depravações do poder público nos faz concluir que o tal Estado Democrático de Direito seria apenas uma abstração ilusória a confundir nossos sentidos, como se todos os dias tomássemos a pílula azul. Por isso, está mais do que na hora de repetir o gesto do Neo, que tomou a pílula vermelha, mesmo que isso nos deixe profundamente decepcionados com o que veríamos depois de acordar.



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