terça-feira, 9 de abril de 2013

Desvirtuamento do Simples Nacional


















Reginaldo de Oliveira
Publicado no Jornal do Commercio dia 09/04/2013 - A117

A premissa fundamental que orienta a legislação do Simples Nacional é conceder às empresas optantes um tratamento fiscal e tributário condizente com a situação de vulnerabilidade dos pequenos negócios através da redução da burocracia e da carga tributária. Tais disposições objetivam criar um ambiente favorável ao desenvolvimento do espírito empreendedor do nosso povo. Sabemos nós que a falta de efetivas políticas públicas de apoio aos pequenos e micro empresários patrocina o agigantamento do submundo da economia informal, incluindo-se práticas ilegais e até criminosas. A própria Constituição Federal dispensa atenção especial nesses termos: "Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei."

O grande e canceroso problema que inferniza os pequenos, médios e grandes negócios é a famigerada insanidade burocrática. Parece que o nosso legislador é atacado por uma comichão toda vez que se debruça sobre o esquadrinhamento e construção de normas legais. Parece até que o assento da cadeira é feito de urtiga. Assim, o legislador é acometido por arrepios ensandecidos de desvarios que o leva a criar loucas e impraticáveis regras tributárias. No Brasil, nada, absolutamente nada é simples. Tudo é muito, muito complicado. Quem se dispõe, por exemplo, a examinar a minuciosidade das regras da substituição tributária do ICMS, fica tonto só de ler. E a confirmação tácita da impraticabilidade dessas maluquices é a assertividade da nossa SEFAZ/AM, que passa por cima da tralheira e vai direto ao ponto quando faz o cálculo da Substituição Tributária Interna.

A própria legislação do Simples Nacional não é nada simples, visto que contém uma infinidade de dificuldades para a sua aplicação prática, exigindo a contratação de consultores especializados para traduzir o calhamaço de regras profusas ao dono do pequeno salão de cabeleireiros. Isso ataca frontalmente as boas intenções contidas no supracitado artigo 179. Um exemplo gritante dessa afirmação é o disparate contido na Lei Complementar 123, que estabelece alíquota de ICMS de 1,25% concomitantemente a alíquota de 17% para empresas que auferem receita anual de até R$ 180.000,00. Isso acontece porque o instituto da substituição tributária do ICMS atropela o espírito do Simples Nacional com um rolo compressor. Assim, o quadro de alíquotas de ICMS do Anexo I da LC 123 vem aceleradamente perdendo seu caráter de seletividade tributária, visto que a quantidade de produtos alcançados pelo ICMS ST cresce exponencialmente, indicando que brevemente toda a cobrança de ICMS será antecipada (no Acre já é assim). Nesse dia o tal quadro de alíquotas do ICMS será sepultado. De certa forma, isso já está acontecendo com as pequenas lojas de material de construção, que são impactadas com a mesma carga tributária das grandes empresas do mesmo ramo.

A LC 123 obriga o dono de uma loja de 10m2 a efetuar os procedimentos técnicos de cálculo do ICMS ST, os quais são difíceis de operacionalizar até mesmo para empresas cem vezes maiores. Além disso, o dono dessa lojinha é obrigado a comprar sofisticados equipamentos e softwares que permitam a análise individualizada de uma dúzia de características de cada produto trabalhado, tais como CST, NCM, unidade, peso, CFOP, alíquota, origem, desmembramento, agrupamento, código EAN etc. E tem mais. Toda a variedade de características dos produtos deve está rigorosamente adequada nos seus respectivos cadastros para atender as ultra complexas exigências das obrigações acessórias, sob pena de pesadas multas infracionais por descumprimento dessas ditas obrigações acessórias. Claro, sabe-se que a contratação de profissionais especializados que possam fazer a coisa funcionar por inteiro nunca estará ao alcance da pequena empresa.

Daí, que na prática, as pequenas empresas acabam ignorando o calhamaço legislativo a que estão enquadradas e seguem tocando a vida do jeito que der. A consequência mais comum é o pagamento dobrado do ICMS. Ou seja, pagam na compra e pagam novamente na venda, visto que é difícil identificar e segregar os produtos sujeitos ao ICMS ST. Isso as coloca em situação de vulnerabilidade por dificuldade de cumprimento das obrigações acessórias. E o mais incompreensível nisso tudo é a leniência de quem deveria está lutando para mudar esse estado de coisas.

O contrassenso do ICMS ST está lá, na LC 123, mas é lei, como se a lei fosse algo emanado dos céus, induzindo-nos à crença de que seu caráter dogmático afasta qualquer tipo de questionamento. É esse tipo de catequese que os governantes tentam empurrar na nossa garganta. Já está mais do que na hora de lutarmos contra a compulsão pela burocracia exacerbada que está fortemente marcada no DNA dos nossos legisladores, os quais não conseguem de forma nenhuma criar regras práticas, justas e exequíveis. 





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